Thursday, March 19, 2009

Bankruptcy


Após este doloroso interregno regresso para vos contar as minhas aventuras campestres. Decidi que este meu ano quase sabático seria passado numa calmaria bucólica.

E que melhor sítio para vivenciar a luta de classes do que no meio da labuta diária... dos outros. Eu adoro o Proletariado e o Capital. Tem tanto de erótico. Divirto-me a ver passear famílias arruinadas em que a matriarca conserva somente três cabelos brancos amarrados num bouffant glorioso e, por sua vez, os novos rebentos esticam ao máximo as roupas de spandex.

O marido tem uma amante que leva arraias de porrada do primogénito viril com o consentimento da mãe e o conhecimento da família inteira. A mãe faz Richelieu e comenta as amantes dos outros quando sai para comprar fio.

Conservam somente a casa decrépita já que tudo em volta foi loteado ou vendido à criadagem. Têm idas esporádicas ao Porto para comprar tecidos e regressam invariavelmente à mesma modista que leva muito em conta.

O menino tem um hárem de social climbers, umas mais ou menos rústicas, com as quais entretém os anseios de continuidade, apesar de manter relações incestuosas com umas quantas primas e umas experiencias sórdidas com um qualquer cavador de vinhas.

A menina tem tiques de realeza mas já não toca piano porque está no prego ou por afinar. Tem jeito de menina dócil, riqueza de seu pai e à noite desliza as mãos entre os glúteos e confirma as virtudes do matrimónio, tantas vezes lhe confiadas por alguma criada de língua mais solta.

Há espécimes para todos os gostos. Como dizia Almada Negreiros, temos "os Vaz, os Estrela, os Lacerda, os Lucena, os Rosa, os Costa, os Almeida, os Camacho, os Cunha, os Carneiro, os Barros, os Silvas, os Gomes, os velhos, os idiotas, os arranjistas, os impotentes, os celerados, os vendidos, os imbecis, os párias, os ascetas, os Lopes, os Peitoxos, os Motta, os Godinho, os Teixeira, os Câmara, os diabo que os leve, os Constantino, os Matos, os Alves, os Albuquerques, os Sousas e todos os Dantas" que por aqui andam e aqui me divertem de morte!

E no entanto, para meu espanto, como os entendo:

Anyone who lives within their means suffers from a lack of imagination